Pedaço de Mim



            Os momentos em que mais escrevi durante minha vida foram aqueles em que eu estava com o coração partido. Sempre acreditei que a dor decorrente do amor fosse uma das principais inspiradoras para arte – vide a segunda fase do Romantismo, uma das minhas favoritas. Apesar disso, tenho passado por um ócio criativo enlouquecedor e, porque não, desnecessário nos últimos meses.
            Passei um bom tempo abrindo o caderno ou o notebook e ensaiando algumas poucas palavras que possuíam tanto nexo quanto os rabiscos de uma criança que ainda aprende a ler e a escrever. Nada fazia sentido. Tantas e tantas coisas surgiam em meus (não publicados) textos, que cheguei, até mesmo, a questionar o possível talento que um dia cheguei a achar ter. Era doloroso. Aquilo que antes satisfazia a minha alma e me deixava em êxtase, havia se tornado uma mera casualidade, algo que não emanava nenhuma emoção – principalmente em mim.
            Ontem, antes de dormir, comecei a refletir sobre a minha vida. Lembrei dos momentos difíceis que passei ao longo dos últimos dez anos – em especial daqueles que ainda me parecem não superados – e me abismei com o número de situações difíceis que tenho passado – e sobrevivido. De uma depressão – período em que sequer conseguia sair do quarto – a viagens com o grupo de teatro. Deixei de ser aquele alguém que se apaixonava com a mesma facilidade com a qual o álcool entra em combustão para alguém que age com cautela e que aprendeu a se amar acima de todas as coisas – algo que foi extremamente necessário. De planos e mais planos para o longo da vida a um tumor que, sete meses após ter sido descoberto, desapareceu. De um amor que eu pensava ser para o resto da vida à maior decepção amorosa que eu poderia ter vivenciado.
            É... Acho que minhas contas estavam erradas.
            Nos últimos tempos, todos os meus textos surgiam com um desejo enorme de colocar para fora essa “dor de amor” e acredito que eu estava errado quanto à válvula de escape por mim escolhida. Havia coisas maiores, coisas principalmente relacionadas a mim e ao meu modo de ser e de viver. Dos catorze textos não finalizados na minha pasta, fora os apagados quase que semanalmente às 02h da manhã, creio que noventa por cento se referiam a esse amor.
            Uma amiga disse recentemente que, quando sabemos que alguém está prestes a morrer, vamos sentido a dor daquela morte pouco a pouco, de modo que, quando ela se vai, a dor é minimizada. Não sei se trata de uma regra geral, mas faz sentido pra mim. Sempre fez. Ao longo desses últimos meses, venho prestando luto não a um amor que morrera subitamente, mas a um que morrera desde o momento em que nascera. Um amor que fora sustentado até o último minuto com a ajuda de aparelhos, os quais eu mesmo fiz questão de desligar. Não creio que eu tenha passado esses últimos longos meses sem conseguir escrever graças a uma dor de amor. Havia sim a dor, a saudade e a mágoa, mas também um certo alívio.
            Acredito que eu tenha passado os últimos meses tentando cuidar de mim, tentando me encontrar, tentando me ajustar um pouco a esse novo eu, criado por mim mesmo, graças a mim e às minhas escolhas. E como em toda mudança, é melhor mostrar o resultado e receber visitas quando tudo está devidamente no lugar. Uma mudança que ainda não sei se chegou ao fim, muito menos se um dia chegará. E eu prometo que, assim que tudo, ou pelo menos a maioria das coisas, estiver no lugar, estarei aqui para contar um pouco mais sobre o que aconteceu e sobre o que o mundo nos guarda.

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