Reflexo
Sabe... Às vezes eu não queria
ser tão racional. Às vezes eu queria deixar que as minhas emoções falassem mais
alto, que meus impulsos e instintos me determinassem num ímpeto de burrice. Ou
seria num ímpeto de permissão? Não sei. Às vezes me olho no espelho e não me
reconheço mais naquele pequeno pedaço de vidro. Me sinto um completo estranho,
irracional, sem cabeça, sem o meu corpo. Apenas um reflexo bobo e inútil sem
consciência. Será que eu sou tudo isso? Será que, no fundo, acabei deixando de
ser quem eu era ou quem eu queria ser? Será que, no fundo de toda essa droga,
eu acabei me tornando apenas uma imagem minha moldada no que mais detestei?
Será que eu sou o meu próprio medo? De vez em quando, eu me pego pensando no
que eu poderia ter sido se não tivesse perdido a minha “essência do passado”,
se não tivesse me juntado ao resto do mundo e me tornado apenas uma parte de
mim... Tem horas que me sinto farto. Farto do que fui, do que quis ser. Farto
do que me tornei... E como me tornei.
As palavras não conseguem mais
me refletir. Tornaram-se cansadas, fartas e tão rasas. Onde estarão as cores que
antes tanto me disseram existir? Onde estarão as palavras que antes me
confortaram e me impulsionaram? Nem mesmo eu sei onde as guardei após tanto
tempo. Vez ou outra, tento buscar partes de mim em uma das minhas gavetas. Será
que deixei os meus cacos, os meus pedaços, os meus laços, jogados na gaveta das
cuecas? Ou seria na gaveta das bermudas? Será que ficaram trancafiados com as
roupas de inverno ou com meus antigos brinquedos?
Quer saber? Acho que eu ainda seja o mesmo. Talvez mais velho, mais magoado, mais experiente, mais tudo. Creio que tudo isso seja uma válvula de escape, uma forma de buscar no passado algo que não está mais presente. Creio que seja a hora de olhar para frente e encarar esse reflexo, o reflexo do passado e do futuro, do que fui e do que ainda serei. Eu sou apenas o meu reflexo. O reflexo de um homem que busca ser ainda um reflexo que já não existe mais...
Texto Orginalmente publicado em 15 de março
de 2015.
Revisado em 02 de dezembro de 2020.
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