O Quarto


Eu poderia fechar as janelas, mas a música me parecia tão condizente ao momento. Por mais que as paredes fossem velhas, que o chão estivesse sujo e que eu estivesse em meio a lágrimas com uma garrafa de vodka em uma das minhas mãos, eu poderia dizer que havia beleza naquele momento. Tantas pessoas falam que homens não choram, mas estão enganadas. Homens choram.

É como se fosse o fim de uma história. É como se todos os meus sonhos tivessem chegado ao fim e eu estivesse preso ali, mas com as janelas e portas destrancadas me esperando para sair daquele fétido lugar. Eu poderia sair, eu deveria sair; mas eu não conseguia. Após tanto tempo, após tantas feridas terem ficado em aberto, eu me vi perdido, sem esperança, com o coração vazio.

As circunstâncias que haviam me levado até ali foram as mais banais: traições, mentiras, jogos mentais... Enfim, coisas que todos dizem que “vai passar”. Não... Não vai passar tão fácil quando você só estiver acostumado a elas, quando você passar anos e mais anos apenas com essas visões da vida, quando todas as coisas boas se tornam mínimas perante às desgraças que acontecem.

Não havia tempo para cicatrizar feridas. Elas insistiam em ser criadas nos mesmos lugares. No coração, no corpo, na alma. Eu havia me tornado um boneco quebrado, uma marionete de tantas mentiras; um alguém que havia perdido a esperança e que, agora, com a liberdade batendo à porta, poderia sair, mas não conseguia. A escuridão havia tomado conta do meu quarto e por mais que as janelas e portas abertas o iluminassem, elas não seriam capazes de iluminar a pior de todas as escuridões: a que estava dentro de mim.

Por trás de todas aquelas bebidas, cigarros e drogas, eu sabia que, no fundo, eu estava morto. Eu havia sido morto aos poucos pelos meus amigos, pelas minhas amantes – os meus grandes amores –, todos aqueles em quem eu havia confiado. Era tarde, era tão tarde que as coisas boas haviam se tornado ínfimas perante à vida com a qual eu havia sido apresentado. Não havia mais coração para ser preenchido ou resgatado. Não existiam palavras que fossem capazes de me fazer sorrir. Havia apenas o homem sentado numa poltrona com uma velha garrafa de vodka na mão direita e um cigarro quase terminado na mão esquerda.

Havia beleza naquele momento. Havia beleza nas minhas lágrimas. Acho que havia um pouco de esperança bem lá no fundo. Uma esperança de que tudo se resolveria, de que todas as verdades seriam expostas. Havia a esperança de que eu, somente eu, fosse capaz de sair daquele quarto. O caminho até a porta estava livre e só cabia a mim escolher como ir até lá: rastejando, caminhando ou correndo.

 

Texto Originalmente publicado em 10 de outubro de 2015.

Revisado em 04 de abril de 2021.



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